Analivia Cordeiro
Brasileira, nascida e radicada em São Paulo em 1954

© The artist
Analivia Cordeiro reinventou a figuração para uma nova era. Sempre inovadora, ela descreve sua abordagem artística como pesquisas. Éuma acadêmica de grande destaque, com prêmios e títulos nas áreas de dança, arte e arquitetura, multimídia, ciência da computação e semiótica. Seu orientador de doutorado foi Arlindo Machado, e ela completou o pós-doutorado em 2010 e novamente em 2018 com sua tese influente, “A Arquitetura do Movimento Humano.”
Simultaneamente, ela desenvolveu suas habilidades como dançarina e coreógrafa, tanto na técnica clássica quanto na moderna, com treinamentos em São Paulo, Nova York e Paris. Ela se concentrou em abordagens progressistas defendidas por grandes nomes como Rudolf von Laban, Merce Cunningham e Martha Graham. Além de se destacar como performer de palco ela segue sendo uma educadora, palestrante e artista visual renomada, com ênfase nas aplicações digitais para a expressão artística.
O foco do BFVPP está no trabalho pioneiro antes de 1985, e o que segue descreve as influências e conquistas iniciais de Cordeiro. Seu pai, Waldemar Cordeiro (brasileiro, 1925-1973, nascido em Roma), explorou a figuração de vanguarda na pintura e a abstração neoconcreta. Ele também foi um intelectual ativista e teórico da arte, um paisagista inovador e autor de manifestos, periódicos e críticas de arte.
No final dos anos 1960, esse pioneiro nas aplicações de informática na arte fez experiências com o maciço IBM 360/44, em parceria com o professor de física Giorgio Moscati. Para destacar a interface entre arte e tecnologia eletrônica, em 1971, ele produziu uma lendária conferência e uma exposição de obras de artistas internacionais. A Arteonica foi inaugurada no Museu de Arte Brasileira da Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP).
No início dos anos 1970, Analivia, ainda adolescente, já experimentava com dança, performance e trabalhos de luz, além de se familiarizar com os primeiros sistemas de computação. Seus esforços impressionaram diversos participantes de conferências, resultando em convites para eventos internacionais, como o INTERACT Machine : Man : Society, em Edimburgo, em agosto de 1973.Esse convite, da Computer Arts Societyinternacional, impulsionou seu trabalho em andamento. Ela recorreu ao centro de computação da TV Cultura de São Paulo e da UNICAMP para ajudar na realização de uma obra fundamental. O M3x3 (1972-1973)combinava coreografia, espaço real e dados movidos por computador em uma instalação de vídeo impactante, quase uma escultura cinética – um marco da arte brasileira que ainda hoje é requisitada para exposições.



Conceitualização M3x3 (1972-73)
Além da influência de seu pai, Cordeiro frequentemente menciona o impacto de suas memórias mais antigas – como observar um móbile de Calder suspenso sobre seu berço e seus encontros com um filme excepcional. Em uma excursão de classe de dança ao Goethe Institut, ela descobriu um filme sobre o período Bauhaus de Oskar Schlemmer, o Ballet Triádico (1922), e voltou para assisti-lo várias vezes. Além disso, ela estudou abstrações geométricas de artistas do início do século XX, como Mondrian.O poder duradouro do M3x3 pode estar relacionado à sua combinação de vários modernismos — Concreto, Construtivista, Op, Minimalista e noções de Arte Conceitual — fundidos em algo que vai além da soma das partes. Sua figuração radical não foi apenas uma inovação formal. Edward Shanken sugeriu que o M3x3 revela implicações revolucionárias mais amplas. Segundo ele, Cordeiro usa “corpos femininos pós-coloniais para contestar expressivamente a relação entre controle e liberdade em uma sociedade tecnológica e masculinista… em particular, (contestando) uma forma extrema de controle imposta pela ditadura militar do Brasil”.
Produção M3x3
Filmado em um estúdio de televisão, Cordeiro descreve: “Baseado no computador o roteiro coreográfico (é conduzido por) três câmeras: uma à frente, uma na lateral e outra focada para cima em um espelho no teto, posicionado para ficar paralelo ao chão do cenário…” (essa invenção foi para compensar as limitações de altura do teto). A curadora Claudia Giannetti confirma que o espaço “foi dividido em nove quadrados (marcados por marcas pretas nas paredes e no chão brancos, daí o título 3×3).” Como em suas performances de dança anteriores, Cordeiro desenhou os figurinos. O jogo gráfico em preto ebranco, usado para o fundo, as roupas e a pintura corporal, compensaram as limitações de baixa resolução (uma característica das primeiras versões da tecnologia de vídeo e filme vintage). O efeito fundiu o espaço de, ao redor e entre os dançarinos e seu cenário. Em instalação, a obra é projetada para absorver um canto do espaço. Isso revitalizou as dimensões de formas reais e meta, absorvidas pelos construtivistas russos. A peça foi filmada em vídeo ¾ Umatic, mas transferida para filme 16mm para a estreia internacional (e foi remasterizada digitalmente). Um metrônomo forneceu o único som. Giannetti e a artista destacam que, apesar dessa batida insistente, os dançarinos, “tendo recebido certas anotações… tinham certa liberdade interpretativa na transição dos movimentos.” Ou seja, nesse trabalho, as irregularidades (humanas) coexistem com a programação geradora e a edição movida por computador. A sensibilidade pós-industrial incorporou o distanciamento da automatização, mas também trouxe o entusiasmo pela inovação espontânea e do acaso.
M3x3 recentemente
M3x3 persiste – a obra ainda provoca reações. Em 2015, o vídeo foi premiado com o Prêmio BEEP de Artes Eletrônicas na ARCO Art Fair, em Madrid. Lá, Giannetti conheceu a artista, o que levou à sua retrospectiva no ZKM (Center for Art and Media) Karlsruhe, Alemanha, produzido em 2022 com o padrinho da arte de mídia, Peter Weibel.
Em 2023, foi exibido no CODED : Art Enters the Computer Age, 1952-1982 ( Museu de Arte do Condado de Los Angeles) e foi citado por um crítico como uma das obras mais significativas da grande exposição. Mesmo nesta era de avanços digitais constantes, os espectadores respondem ao M3x3 e mal conseguem resistir ao impulso de entrar na trajetória do feixe do projetor. O encanto do vídeo inaugural de Cordeiro é racional mas etéreo, monótono mas hipnotizante, vintage e inovador, formal, mas evocativo, irreverente mas preciso, gestaltico e, por fim, inesquecível.
Além M3x3
M3x3 levou Cordeiro a aprofundar suas investigações sobre videodança gerada por computador através de uma série de três obras, sob o título 0°‹—›45°, produzidas e modificadas de 1974 a 1989. A artista se apresenta em cada vídeo de canal único, com a composição Fox Trot de William Russell, conduzida por John Cage. Ao descrever a versão III,a artista comentou: “Pode ser interpretado como uma representação da visão fragmentada da imagem corpórea como consequência do agito em sociedades industriais e informatizadas, juntamente com o impacto dos vários meios de comunicação na percepção do indivíduo.” Cordeiro produziu uma sucessão de obras de dança em vídeo de canal único, incluindo Gestos (1975), Cambiates (1976) e e (1979). Ela também desenvolveu apresentações de dança ao vivo e desenvolveu um meio original de notação de dança, o Nota-Anna. Ao mesmo tempo, manteve uma agenda rigorosa de estudos contínuos, palestras, escritas e residências.
Durante os anos 1970, a artista se imergiu com tribos Amazônicas por mais de dois meses para produzir um estudo antropológico. Com slides de 35mm e filme Super 8, ela registrou seu cotidiano, a linguagem falada e a linguagem corporal. Focou nas histórias, coreografias, vocalizações e instrumentações incorporadas no Kwarup – o ritual da morte. Seu registro explorou narrativas cerimoniais e histórias de origem contadas através de personagens inspirados por entidades cósmicas e pela flora e fauna locais. Ela sintetizou suas descobertas, criando um (ainda!) arquivo reconhecido, um livro, uma exposição acadêmica chamada Manuara (Memória) e um documentário. Cordeiro, também usou a experiência para aprimorar sua própria prática de dança.Esse esforço ecoa os de outros pioneiros brasileiros da vídeo arte, que utilizaram diversos meios para refletir sobre a interface entre as comunidades indígenas e as identidades brasileiras individuais, artísticas, coletivas e nacionais.
Filmografia
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M3X3 (1973)
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0º – 45º (1974)
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0º – 45º- versão II (1974)
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0º – 45º- versão III (1974 - 1989)
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Kwarup (1975)
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Gestos (1975)
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Cambiantes (1976 - 2015)
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Nota-Anna (1982/1994)
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Trajetórias (1984)
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Slow Billie Scan (1985)
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Ar (1985)
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Wearables (1989)
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Micron Virtues (1992)
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Striptease (1997)
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Performance 0°‹—›45 (1998)
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História de Laban (1999)
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Laban Art of Movement (1999)
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Ducorpo (2004)
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Carne I, II e III (2004, 2007, 2009)
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Crianças (2005)
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DJ Mobile (2005)
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Architecture of Movement (2006 - 2015)
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Understandable Fuzziness (2007)
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Unsquare Dance (2007)
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Performance Toca / Âncora (2009)
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Você (2009)
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Alfabetização (2010)
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Folhas e troncos (2014)

BFVPP Ensaio
Recursos

Analivia Cordeiro : From Body to Code
Pioneira do vídeo e da arte computacional, Analivia Cordeiro vem explorando as relações entre o corpo, o movimento, a arte visual e audiovisual e a arte da mídia desde o início dos anos 1970. No contexto da exposição, a ZKM está publicando uma monografia em inglês sobre o trabalho da artista.

Coded: Art Enters the Computer Age, 1952-1982
Artistas, escritores, músicos, coreógrafos e cineastas exploram as possibilidades de dados, digitalização e algoritmos no início da tecnologia da computação.
Editora: DelMonico Books/Los Angeles para Los Angeles County Museum, 2023

THE SEARCH FOR ENTROPY: LATIN AMERICA’S CONTRIBUTION TO DIGITAL ART PRACTICE
Entrevistas com artistas e intelectuais nascidos antes de 1959 analisam o impacto de Brasília e o surgimento do modernismo brasileiro. Publisher – Cobogo Editoria, 2019

Radical Women: Latin American Art 1960-1985
Curators, Cecilia Fajardo-Hill, Andrea Giunta
Catálogo de exposição para uma exposição itinerante, 2017 Publisher – Hammer Museum
COLEÇÕES INSTITUCIONAIS INTERNACIONAIS
A obra de Cordeiro foi adquirida por importantes museus internacionais, incluindo o Museum of Concrete Art and Design e ZKM , Museo Reina Sofia, Oskar Schlemmer Theatre Archive Museum , o Victoria and Albert Museum e o Museum of Modern Art . Suas pesquisas sobre codificação e dança, movimento e figuração, além de temas que vão desde dança folclórica à educação infantil, refletem uma prática eclética. Desde uma série de instruções online sobre de consciência corporal (DuCorpo) até sua mistura de performance de dança com projeções de cor/luz, a artista tem demonstrado constantemente sua fascinação pela figura em movimento e seu talento para quebrar fronteiras.